Mantendo a tradição do copy+paste e, apesar do tempo já passado, o que é tão bem escrito não perde (se calhar ganha) actualidade, assim, com a devida vénia ao
"Da Literatura" permito-me transcrever este magnífico texto de Luis M. Jorge, publicado originalmente n"O Franco Atirador".
Obrigado
António Moreira:
«[...] Mário Soares é um homem com muitos defeitos.
É pouco rigoroso, inchado, agressivo e tem de Portugal a visão de uma coutada ao dispor da família Barroso e dos seus amigos de Macau.
Além disso, está rodeado de gente sem espírito crítico nem competência política, o que se paga caro quando é preciso alinhavar uma estratégia ou impôr alguma modéstia à feira de vaidades que é este país.
No entanto, creio que Mário Soares tem grandeza.
Ele combateu o Salazar, quando Cavaco combatia por medalhas de atletismo.
Ele criou um partido no exílio, quando Cavaco criava raízes em York.
Ele ajudou a fazer o 25 de Abril, lutou por uma democracia representativa, combateu os comunistas, calou os militares, e impôs algum juizo ao General Eanes quando ele se convenceu que era o General de Gaulle.
Aliou-se aos americanos, incorrendo no ódio mortal da nossa patética esquerda.
Impôs disciplina financeira a uma terra que ainda andava a falar de reforma agrária.
E, acima de tudo, colocou esta nação de trôpegos e néscios camponeses na União Europeia. [...]
E enquanto isso, o que foi feito de Cavaco?
Cavaco andou a tratar da vidinha e a dar-se ares de “grande homem”, “rigoroso” e "competente”.
Eu não tenho nada contra o fascínio das classes médias por um módico de respeitabilidade.
Só que ser respeitável não é um salvo-conduto para a santidade, nem o devia ser para uma Presidência da República. [...]
Mário Soares não é Manuel Alegre nem está, felizmente, senil.
Lembra-se como gozavam com ele quando iniciou esta campanha?
Como a Direita o tratava com desdém?
Como diziam que tinha o espírito toldado, a cabeça imprestável, o verbo desarticulado, o ouvido duro, as respostas desfasadas?
Não ouvi ninguém queixar-se disso ontem à noite.
Ontem à noite, Mário Soares humilhou Cavaco Silva.
Fê-lo sem civilidade?
Talvez.
Mas isso não desculpa que o vosso “brilhante”, “competente” e “rigoroso” timoneiro saísse dali vexado por um ancião. [...]
Quanto aos próximos debates, concordo que não serão necessários.
Cavaco Silva, tal como George W. Bush, vai ganhar.»