terça-feira, novembro 29, 2005

Conversa da Semana Passada

A questão do “motor da economia” não é AQUI, sequer, uma questão de teoria económica.
Então o Estado não produz riqueza, é?
Apenas podemos considera-lo melhor depositário e consequente gestor da parte comum da riqueza por nós produzida, é?
Mas lá que isso é duvidoso, é. Pelo menos se assim fosse, era.
Como todos sabemos, uma das disputas do Sec. XX foi mesmo a da natureza produtiva ou não dos Estados (já lá voltamos), ok, não será essa a sua melhor vocação. Podemos dividir-nos no sentido a dar à nossa opinião, à nossa escolha.
Podemos preferir e acreditar que seria melhor que o Estado (que somos todos nós, mas também já lá voltaremos) tomasse nas suas mãos a produção (a criação de riqueza, ou não?) ou, pelo contrário, que o Estado se reduza a proporções mais ínfimas (regulação, soberania, etc.), quase nada até, e deixe aos privados a actividade produtiva, a criação de riqueza e de preferência que atrapalhe pouco. Eu não concordo, mas vamos lá…
É verdade que os modelos de economia planificada e estatizada não vingaram, mas dai a dizer que o Estado não produz riqueza ainda vai um bocadinho. As Practika não ficavam nada atrás das Pentax, pois não? Pois não, mas não era isto, era a questão do “motor da economia”.
O que eu digo é que existe uma muito longa tradição em Portugal, quanto a mim consequência da nossa cultura mediterrânica (E. T. Hall caracteriza isto muito bem) de ter o estado como motor da economia e que essa não é a raiz dos nossos actuais problemas. É quase uma inevitabilidade num país com a dimensão do nosso e com a nossa herança cultural. Poderia ser diferente se tivéssemos uma outra escala, ou se acaso pertencêssemos a um outro envolvimento cultural.
Podemos seguir ou experimentar caminhos ideológicos muito distintos, mas os grandes desígnios, aqueles que pela sua dimensão arrastam consigo a generalidade dos agentes económicos, ficam sempre a cargo do Estado, ou então não se cumprem.
Claro que os liberais mais convictos alegam já a seguir que é o estado que não dá espaço, que não permite que a economia se desenvolva livremente, baseada no binómio oferta / procura, que por sua vez resolveria todas as questões de equilíbrio social e de justiça e que ainda permitiria avanços e progressos muito mais acelerados. Mas nós sabemos que não é assim. Sabemos até que não resolve quase nada e que simplesmente acentua os desequilíbrios sociais. Mas a questão aqui nem sequer é essa, não a podemos colocar de forma exclusivamente ideológica. A questão põe-se com a pergunta que o amigo Moreira já aqui pôs, onde é que eles estão?
Não tem faltado oportunidades aos agentes económicos privados de demonstrar que a sua acção é melhor e mais benéfica para a sociedade (ainda que não seja o seu fito, porque esse é o lucro) do que a que o estado vem exercendo. Mas a verdade é que nada.
Quase sem excepção, sempre que o estado abdicou de uma qualquer porção da actividade económica em favor dos privados, aparentemente as coisas melhoraram, mas na realidade as pessoas (cidadãos deste pais) ficaram sempre pior servidas.
Foi assim com os transportes (urbanos e não urbanos), foi assim com os bancos e seguradoras, é assim com a saúde, é extraordinariamente assim com a educação, foi e é assim com as telecomunicações, com os produtos petrolíferos, e assim vai ser com a energia eléctrica, etc., etc..
Mas isto é naquilo que os privados abraçam, porque as coisas mais estruturantes, chamemos-lhes assim, nem sequer lhes interessam.
Por exemplo, eu não me importava nada que a AMTRAK viesse a Portugal criar e explorar o TGV. Ó pá, mas eles não vêm… Eu não me importava nada que a associação dos empresários do sector turístico ali de Viseu, reabilitasse a Linha do Vouga. Mas eles nada… Aquilo está parado há dez anos e este governo até não se portou nada bem, mas o que é certo é que eles nada.
E aqui é que entra a questão cultural. Em Portugal, se não for o Estado o motor, a carroça anda a pedais, isto é, não anda.
Na melhor das hipóteses temos os Amorins e os Belmiros (também já lá vamos), que “até são bons exemplos”, imagine-se.
Para dizer o que? Que um americano pode ser liberal ou até progressista de uma outra forma, com uma distancia em relação ao estado. Em Portugal, se não for o Estado, somos ultra conservadores, no sentido de que o tempo pára mesmo. Por isso é que foi sempre o Estado, foi ou não foi? Muitos dizem que é uma herança do Estado Novo, mas não é, foi sempre assim. Pelo menos desde as especiarias da Índia e a seguir do ouro do Brasil.
A verdadeira conquista está nas pessoas (até porque os mais atentos já terão certamente constatado que os comportamentos variam muito pouco, dentro e fora do estado). Mas não no sentido de que fala o Moreira, isto é, não é uma questão de culpa das pessoas. As pessoas são estas, somos nós.
E isto não foi a lado nenhum? Como não? Há trinta anos éramos colonialistas em África e hoje estamos no pelotão da frente da Europa e isto não foi a lado nenhum? Hoje há milhares e milhares de pessoas, de outras nacionalidades, europeias, africanas, asiáticas e americanas, a querer viver e trabalhar cá e isto não foi a lado nenhum?
Mas vamos então aos Belmiros e Amorins, os tais maiores criadores de emprego.
Mas o que é que tem feito por “isto”? Não é evidente a asfixia que provocam nos parceiros comerciais e ainda mais nos concorrentes? Não é evidente que os mecanismos de retenção de capitais e ausência de stocks condenam sem piedade largos sectores da classe média que é invariavelmente o sustentáculo social das comunidades. Não é evidente a degradação da qualidade do emprego que provocam. O que está em questão não é a quantidade do emprego, mas sim a qualidade do emprego. É evidente que aqui os padrões de cada individuo e de cada grupo são diferentes, mas para quem acredita, como eu, que com a quantidade de riqueza criada podemos viver cá TODOS e viver bem (este acreditar não é tanto uma questão de fé, mas mais uma questão de calculo), os ditos não são exactamente bons empregadores, para além de serem muitas outras coisas menos boas (aquilo é tudo tão reles, a começar pelos projectos de arquitectura que promovem).
O problema da riqueza é de distribuição e essencialmente de desperdício, não de produção. Parece-me evidente que tem que existir um equilíbrio entre o valor trabalho e as outras formas de criar riqueza, que no caso está completamente distorcido (perdoem-me a linguagem pouco técnica). A questão de saber se a riqueza que produzimos é ou não suficiente para as necessidades que criamos não é exactamente esta, é saber se a riqueza que produzimos, DISTRIBUIDA E DESPERDIÇADA desta forma é ou não suficiente para as necessidades que criamos, adicionadas às necessidades que nos são impostas e às necessidades que nos são sugeridas. Está bom de ver que a resposta será sempre um rotundo NÃO. Quando juntamos isto ao referido desequilíbrio no valor do trabalho chegamos sempre a uma situação de insuficiência, ainda por cima facilmente comprovável pelos níveis sempre crescentes de endividamento. Insuficiência essa que encontra como resposta a necessidade de produzir mais e com menos custos, numa espiral de tensão social estranhamente benéfica para os mesmos de sempre. Os mesmos de sempre, curiosamente.
Agora emprego a sério, não são os Belmiros nem os Amorins. Não digo que seja só o Estado, porque não é, mas enfim.
Se olharmos para a evolução histórica, que tipo de emprego deveríamos aspirar por esta altura do campeonato? Quantas horas de trabalho, que direitos e que deveres? Que garantias, que dedicação? A informática não ia servir para trabalharmos todos apenas metade do tempo, que as máquinas fariam o resto? Então porque não sucedeu? Ou será que sucedeu e essa riqueza anda a ser mal distribuída e muito desperdiçada?
Talvez não fosse a distribuição da riqueza o grande problema dos países comunistas, mas sim a produção e mais uma vez, sobretudo o desperdício. O estado dificilmente é “nós”, mas sim uma entidade semiabstrata que existe nas nossas cabeças principalmente para complicar. Dai que colectivamente acabamos sempre, no mínimo, displicentes em relação às coisas do Estado, fazendo-o fracassar quando atinge grandes proporções.
Mas dai a dizer que o Estado não produz riqueza vai um grande grande passo. Mesmo directamente produz riqueza, mas então de forma indirecta, nem se fala. Ó Moreira, eu não acho que a vocação do Estado seja lucrar com a OTA, mas sim cumprir o desígnio de ter uma rede de aeroportos válida que sirva uma rede de transportes aéreos válida, capaz de SERVIR os cidadãos e, se possível, criar riqueza. No caso da linha do Vouga, que dificilmente poderá criar riqueza, o Estado deve mantê-la, custe o que custar.
Que não fique a sensação de que me agrada o estado das coisas e que defendo um Estado pesado. Não, em Portugal, na minha opinião o peso do Estado é excessivo e tem que ser corrigido, mas nunca diminuindo as suas virtudes, porque se alguma coisa de bom ainda se vai fazendo é através do Estado. Das duas uma, ou o Estado abraça outras áreas da actividade produtiva e não é provável que o faça (mas poderia faze-lo e bem), ou terá que emagrecer, porque é excessivo para actividades de soberania e regulação, ainda por cima quando as exerce tantas e tantas vezes em duplicado e triplicado (ex: as SRU’s).
Quanto à OTA, eu já referi que por mim não se fazia, mas que não virá grande mal ao país se se fizer. Mas quando escrevo que não fazia, não é porque as razões para o fazer não me convençam, e sim por um outro tipo de convicção, mais empírica, que me diz que os transportes aéreos não vão evoluir da forma que os estudos actuais permitem antever. Agora a argumentação para não fazer o aeroporto tem aspectos tão caricatos como a contrária. Então os arautos da poupança não se lembram dos tremendos dispêndios ano após ano de gestão corrente, se em vez de um só aeroporto se distribuísse o tráfego aéreo por dois ou até três aeroportos (Beja, Figo Maduro, Portela, etc.). Mas isso é coisa que se proponha como solução. Numa era em que os custos de investimento em infra-estruturas se amortizam em cada vez menos tempo, em que os custos com mão de obra assumem proporções inviabilizadoras… O problema, quando se cria um novo equipamento não é quanto esse equipamento vai custar, mas quanto vão custar ao fim de x anos as pessoas que lá vão estar a trabalhar. Principalmente se for no Estado, que não tem a flexibilidade dos privados. (Nalguns casos já quase se justifica estar sempre a construir o mesmo equipamento, porque numa sociedade em permanente mudança, os ganhos de produtividade inerentes a uma nova organização, por sua vez inerente a uma nova construção, são compensadores em relação aos custos de construção).
Como ia dizendo lá atrás, a grande conquista está nas pessoas. Está em conseguir operar algumas mudanças fundamentais nas mentalidades colectivas. Para que aquilo que lhes põe à frente como um imperativo quase moral (tipo se não há dinheiro é porque produzimos pouco, insinuando que trabalhamos pouco e temos ordenados e regalias a mais) seja objecto de reflexão critica. Para que controlemos melhor as nossas atitudes mais displicentes, e consigamos outro tipo de ganhos. Até para que criemos maior indignação face à escabrosa forma como se vai processando a distribuição da riqueza (bolas, porque é que quando nos comparamos com a Holanda ou com a Dinamarca nunca nos surge comparamos a forma de distribuição de riqueza e apenas comparamos os sistemas de saúde?). Será que as fortunas dos Belmiros e Amorims alguma vez poderiam ter tido lugar na Holanda ou na Dinamarca? Quanto ganha um médico na Holanda? Qual é a proporção para o salário mínimo?
A mim preocupa-me principalmente aquilo que atenta contra o Estado Social e também a forma como se destrói o que está bem feito (ou no bom caminho) a pretexto de um qualquer momento menos bom. E por agora, para conversa, já chega.

11 comentários:

AM disse...

Ó Fortuna
Quando eu fico algo desanimado por este “blog” estar algo parado ou quase virado para “recados” internos (que eu, de fora, mal percebo) eis que surge o Fortuna, com uma pérola destas e coloca o SEDE no píncaro dos “blogs”.
É para isto que devem servir os “blogs” é para isto que deve servir o SEDE (acho eu).

Isto não quer dizer que eu esteja de acordo com tudo o que escreveu (estarei com quase tudo), mas lá iremos com tempo, que esta posta é MESMO mirandesa e não uma “tipo mirandesa” como as outras, ou seja, há aqui muito que mastigar, digerir e, só depois, opinar.

Por isso agora só duas notas, em sentidos diferentes:
1ª nota - Cito “ …Quase sem excepção, sempre que o estado abdicou de uma qualquer porção da actividade económica em favor dos privados, aparentemente as coisas melhoraram, mas na realidade as pessoas (cidadãos deste pais) ficaram sempre pior servidas.
Foi assim com os transportes (urbanos e não urbanos)…”
Quanto a este assunto, que conheço particularmente bem, apenas posso confirmar, como exemplo lembro que, quando da aquisição da Rodoviária de Entre-Douro e Minho (resultado do ”trinchamento” da RN) a primeira preocupação do novo proprietário, privado, foi conhecer os períodos de manutenção (mudanças de óleo, filtros, etc.) e, independentemente de considerações técnicas (ou de segurança) passar esses intervalos para o DOBRO! (agora quem quiser que opine).

2ª nota – Cito “…Ó Moreira, eu não acho que a vocação do Estado seja lucrar com a OTA… “
Ó Fortuna eu também não acho que a VOCAÇÃO do Estado seja lucrar com a OTA ou com qualquer outro tipo de negócios.
Agora o que eu acho que é a OBRIGAÇÃO do Estado é garantir que todos os cidadãos tem acesso a um conjunto de DIREITOS (e agora íamos entrar noutra discussão imensa quanto a quais os direitos mínimos) que custam dinheiro.
Para isso o Estado tem que ter receitas, e essas receitas são apenas provenientes de impostos ou do resultado de algumas actividades lucrativas que o Estado ainda detenha após a sanha privatizadora.
Agora como sabemos que a parcela de impostos (directos) é, quase exclusivamente, composta por impostos sobre o trabalho e quase apenas de trabalho dependente, é claro que a receita do Estado é insuficiente.
Depois temos o défice e, então cortamos à despesa, mas onde é mais fácil, nos DIREITOS !!!!!.
Daí que é fundamental actuar na receita, quer recebendo os impostos devidos de uma forma justa e eficaz, quer, complementando essa receita com os resultados das actividades do Estado que criam riqueza.
(mas tanto haveria aqui a discutir…)

Para terminar (por agora)

Cito: “… os Amorins e os Belmiros (também já lá vamos), que “até são bons exemplos”, imagine-se…”
Pronto Fortuna, se isto o choca, eu mudo para “menos maus”.
Eu também gosto muito pouco “daquilo”.
Aquilo está muito longe do modelo de desenvolvimento que eu gostaria de ver na sociedade em que vivo (e em que a minha filha vai crescer (?)), mas, comparando com uma multidão de “chico espertos” que eu conheço, e o Fortuna também, o que se pode dizer?
Triste país em que Amorins e Belmiros “até são bons exemplos” ou “menos maus”

Vou tentar voltar a comentar esta “Grande Posta”

Um abraço e
Obrigado
António Moreira

Anónimo disse...

Obrigado pelo entusiasmo, amigo Moreira. Acho que sim, estamos mais ou menos condenados a voltar a estes assuntos.

Anónimo disse...

Meu caro amigo Daniel,

Que grande posta! Temo não estar à altura para responder à tua exposição, em relação à qual, como já imaginas, estou em quase total desacordo.

Não tenho muito tempo pelo que vou tentando deixar algumas ideias.

A primeira tem que ver com uma questão prévia e que, a meu ver, temos que colocar antes de discutir se o Estado é isto ou aquilo: estamos satisfeitos com o qe temos ou não?

Em determinada altura comparas o onde estamos hoje com há 30 anos. Tenho algumas dúvidas que estejemos no pelotão da frente da Europa mas estamos seguramente muito melhor que há 30 anos. Mas este tipo de comparações são desresponsabilizantes e só servem, a me ver, para justificar a inacção. Podemos ir mais longe e dizer que estamos nos 5 ou 10% mais ricos do Mundo e muito, mas mesmo muito, melhor que o Bangladesh, o Sudão ou a Bolívia. Mas essa foi a nossa sorte (termos nascido aqui) e não chega estar satisfeito por isso.

O primeiro ponto onde me parece que estamos logo em desacordo tem que ver com isto: eu acho que andamos, há muitos anos, a ver passar os comboios e a perder distância para o tal pelotão da frente. E não digo isto porque o nosso PIB cresce agora menos que a média. O PIB vale o que vale e em 2 anos já podemos estar acima da média outra vez (o que duvido). Mas olha para as pessoas à nossa volta (o tal "povo"), para as crianças, para os resultados escolares e pensa como vamos estar daqui a 20 anos. Seguramente muito melhor que o Bangladesh mas em relação aos que estão agora mais ou mesmo ao nosso nível?...

Anónimo disse...

" Quase sem excepção, sempre que o estado abdicou de uma qualquer porção da actividade económica em favor dos privados, aparentemente as coisas melhoraram, mas na realidade as pessoas (cidadãos deste pais) ficaram sempre pior servidas.
Foi assim com os transportes (urbanos e não urbanos), foi assim com os bancos e seguradoras, é assim com a saúde, é extraordinariamente assim com a educação, foi e é assim com as telecomunicações, com os produtos petrolíferos, e assim vai ser com a energia eléctrica, etc., etc.. "

Bancos e seguradoras? Pior hoje que há 20 anos?... Esta nem consigo entender...

Telecomunicações?... Lembras-te quando era preciso esperar 2 meses para te instalarem uma linha?...

E os petrolíferos?... Estamos pior hoje?... Porquê? Porque o petróleo está caro?

Mesmo a educação: está mal por causa da abertura a privados?...

Desculpa lá mas estes exemplos são exactamente o contrário do que queres demonstrar (excluo os transportes por manifesta falta de conhecimento - mas não me recordo de alguma vez se dizer que os transportes públicos funcionassem bem... Talvez houvesse era menos trânsito)

Anónimo disse...

Caro João

Já percebi que o "grande" é em dimensão, e não em concordância.
OK!
Eu hesitei muito em colocar esta posta. Em primeiro lugar porque escrevi tarde e a más horas e passar texto corrido para texto de posta dá algum trabalho, mas isso...
Em segundo lugar porque já sabia que teria que justificar muita coisa. Optei por me disponibilizar para o fazer. E vou faze-lo.

Anónimo disse...

E começo já pela questão das exportações.
Eu concordo que precisamos, como do pãp para a boca, de sustentar mais a nossa economia nos mercados externos e portanto as exportações.
Aliás, meu amigo, tu sabes bem que sempre me pareceu duvidoso que a capacidade de endividamento, juntamente com o turismo, as remessas dos emigrantes e o vinho do porto fossem suficientes para equilibrar a balança de transações externas ou lá como vocês economistas lhe chamam (é que eu não sou do ramo, portanto...), considerando a quantidade de importações.
O que eu quis dizer quando escrevi anteriormente foi que estava errada a politica barrosista e ferreirista patrocinada pelos nossos ilustres economistas (inclusive de esquerda) de fazer tábua rasa da "procura interna" guterrista através do discurso da tanga. Pondo para mais a tónica, de forma populista, no aumento das exportações. O resultado está à vista. Esse sim, está à vista.

Anónimo disse...

Aliás, sempre defendi aqui, que a crise que atravessamos tem uma grande componente de retração dos agentes economicos originada precisamente pelo discurso da tanga. Não é tanto um reflexo da crise europeia e mundial, nem é tanto um reflexo da suposta gestão despesista de guterres. Há dias tive a confirmação (pelo menos uma, que para mim vai chegando).
Falava com pessoas com responsabilidades técnicas e politicas ligadas ao planeamento regional e à analise de indicadores, que se mostravam muito surpreendidas porque normalmente os indicadores de crise economica arrastam atrás de si indicadores de mal estar social proporcionais. E desta vez nada. A degradação social que se vai verificando não corresponde nem de longe nem de perto à degradação economica a que se assiste. Donde se podem concluir várias coisas. Ou criamos almofadas sociais já muito razoaveis, o que não é provavel. Ou os aumentos de impostos desde barroso levaram a um enorme incremento da economia paralela. Ou há retracção no investimento e os capitais não circulam, com consequencias sérias apenas para os mais pobres, ou ou ou. Cada um que tire as suas conclusões.

Anónimo disse...

Bancos e Seguradoras

Há vinte anos tinhamos um sistema bancário pouco ágil, muito burocratizado, a padecer de quase todos os males normalmente associados ao funcionalismo publico, inclusive com filas intermináveis nos balcões. Mas um sistema com um grande numero de trabalhadores, com estatutos proprios e garantias laborais, que apesar de moroso lidava com o capital dos clientes numa base de seriedade e partilhava largamente o risco associado às negociações de capitais. Isto é, os lucros serviam para sustentar todo um sector da classe média.
No processo de privatização, e a pretexto da informatização e das redes automáticas dispensaram-se grande parte das pessoas sob a capa da oferta de serviço, o atendimento continua incrivelmente incomodativo, com laivos de moralidade (apesar dos sorrisos, da personalização) e a responsabilidade é cada vez menos partilhada.
Finalmente a oferta de serviço passou a cobrança de serviço, a resposabilidade é reduzida ao minimo dos minimos, os lucros sobem a niveis nunca vistos e ficam nas mãos de uns poucos.
Mais, como nem se põe a hipotese de baixar os lucros, o aliciamento é escabroso.
Como é que todo um sector lidava com a riqueza e como é que lida agora? Se isto não foi prejudicial para a comunidade, então não sei.
Eu cá não conheço mais nenhuma actividade na qual uma das partes se dê ao luxo de exigir semelhante nivel de garantias. Os bancos e Seguradoras socorrem-se de todos os artificios existentes (se não existem, inventam-nos) para garantir as operações. Ali, o risco é apenas o que decorre dos seus próprios abusos e da ganancia comercial. Portanto, se alguma coisa melhorou foi cosmética ou então decorrente da informatização.
Que tal seria o nosso sistema bancário se tudo tivesse continuado na mesma e apenas tivesse sido informatizado? Será que nos apareceriam extratos mensais em que metade das operações são taxas de isto e taxas de serviço de aquilo?
A ver pela CGD, que continua nas mãos do estado, acho que não.
Aliás, tenho observado com curiosidade como muitos dos nossos quadros, mais atentos, se tem rendido à CGD e aos seu atendimento pouco ágil. Porque será?

AM disse...

Caros Fortuna e JF

Eu também não sou economista (ou melhor a minha licenciatura é outra) mas também não compro essas histórias da solução para a “crise” estar na redução da despesa do Estado e no aumento das exportações (se calhar por isso mesmo, por não ser economista).

Do meu ponto de vista, que não sou economista, mais do que soluções para a “crise” (que não é económica, mas sim social e, acima de tudo cultural) precisamos é de receitas para o desenvolvimento.

E essas receitas devem ser antecedidas, naturalmente por uma análise profunda da nossa sociedade e por um diagnóstico sobre o que está bem e o que está mal, para se perceber onde não se deve mexer e o que se deve corrigir ou melhorar.

Não fiz (ninguém fez) ainda essa análise, pelo que, como quase todos, tenho que usar a minha experiência, a minha sensibilidade, a minha intuição.

E estas dizem-me que algo está muito mal num país em que o primeiro-ministro, socialista?????!!!!!! afirma que a pretensão de ver o salário mínimo subir até uns míseros 500 euritos em 5 anos é DEMAGOGIA e FANTASIA e, no entanto, vemos as nossas ruas repletas de BMW, Mercedes, Jaguares, Porsches, Ferraris, etc., novinhos em folha.

O problema não está, não pode estar na despesa do Estado, pelo menos naquela despesa que se destina a pagar os vencimentos dos funcionários públicos (na sua maioria miseráveis) a garantir as prestações sociais aos pensionistas, aos reformados, aos doentes, aos idosos (também miseráveis), a garantir o acesso à tal saúde (tendencialmente gratuita, lembram-se?), a garantir o acesso à educação, à segurança, etc.
Não meus amigos, o problema não está na despesa, a qual terá necessariamente que aumentar e muito se queremos aspirar a um dia vivermos num país desenvolvido e com índices civilizacionais condignos.
O problema está, claramente, na receita.
Todos sabemos que a receita do estado, no que respeita a impostos directos, vive quase exclusivamente de impostos do trabalho e, desses, apenas (ou quase) do trabalho dependente.
Claramente que o que tem que ser feito passa pela criação de JUSTIÇA FISCAL, ou seja, por garantir que não é apenas o trabalho (dependente) que paga impostos.
Com JUSTIÇA FISCAL decerto que o problema do défice (a níveis de despesa actuais) seria erradicado, pelo que a prioridade poderia passar a ser a JUSTIÇA SOCIAL.

Agora as exportações…
Vamos exportar o quê?
Engenheiros, economistas, arquitectos, licenciados nisto ou naquilo?
Desde o tempo do senhor das “botas” que o empresário português baseou a criação da SUA riqueza no proteccionismo ou no preço baixo, donde, na fraca qualidade e no recurso a uma mão-de-obra pouco (ou nada qualificada) e extremamente mal paga.
O desaparecimento do mercado das colónias, primeiro, a adesão à União Europeia depois.
O desbaratar dos fundos destinados a promover a aceleração da nossa economia para se acertar o passo com os nossos parceiros (nomeadamente na formação e no reequipamento) e, assim, a continuação da aposta na fraca qualidade dos produtos em mão-de-obra barata mas desqualificada, apenas poderia, quando da inevitável (?) abertura dos mercados, conduzir ao desastre.

Mais do que procurar identificar os responsáveis (no final, por acção ou omissão, todos nós) conviria procurar as melhores soluções.

Por isso a minha satisfação com este “post” do Fortuna, concorde-se ou não, com o seu teor.

É fundamental discutir e procurar encontrar as soluções que melhor se adeqúem à nossa sociedade.

Essa discussão deve ser um esforço sério e de espírito aberto, não subordinada a meros e conjunturais interesses ou estratégias partidárias.

Infelizmente não acredito que essa discussão seja possível.

AMNM

Anónimo disse...

Daniel e AMNM:

Gostava sinceramente de continuar a discussão mas o meu desacordo com as vossa ideias é de tal forma grande que não cabe aqui e, com franqueza, também não me apetece ficar muito tempo aqui em frente ao PC.

Para não parecer que estou a fugir à luta, lanço o repto de "tratarmos" disto à boa maneira portuguesa, ie, num almoço. Claro que, dadas as discordâncias gritantes, o AMNM terá que ter cuidado de não me chamar "imbecil" ou sou capaz de perder o fair play...

Um abraço.
Joao

AM disse...

Caro João

Tratamos um dia do tal almoço, e evitamos falar de política, OK?

Um abraço
AMNM